terça-feira, 31 de julho de 2012

Afiada entre as árvores




Um pomar de frutas cítricas, tantos espinhos.
Área pouca entre os troncos magros.
Entre os espaços,
linha de pipa desordenada liga:
cama-de-gato.
Tronco a tronco a tronco até que
todas as árvores estão ligadas.

O velho menino deu os nós, firmes.
A menina velha mistura, prepara,
o casal passa.
É uma cama-de-gato ríspida, cortante
de cerol e mágoa.

É ali que brincam, que lacrimejam e saltam
em malabarismos quase belos, e inconsequentes.
No triângulo entre as linhas, ela tenta
uma ponte,
mas esquece os pés, que levemente se rasgam.
No losango de cerol, ele tenta
cruzar em cambalhota, mas arranha as costas
no próprio vento.

No pomar, tudo parece calmo, tudo se cala.
Só as estripulias de esperança, ineficazes,
tremem as linhas, balançam galhos.
Caem os frutos mornos, maduros,
o chão os acolhe e se acalma.

O ar é que então exala
o cheiro doce cada vez mais doce
da queda dos frutos,
do sangue das pequenas feridas,
das coisas que há horas já ultrapassaram a sua hora.


Ana Claudia Abrantes

3 comentários:

Wilson Torres Nanini disse...

Há tempo para os cataventos e há o tempo de extraviá-los.

Gostei muito das analogias.

Abraços!

Clara S. Weisz disse...

que sentido poema...
nostálgico. lindo!

Tiara Sousa disse...

Amei o texto e o blog!