quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Haverá outras vozes e vezes. O país ficou quente, os déspotas, mais duros e desvelados. Gases e balas de borracha têm aberto clareiras de fogo; quebram vidraças. As pessoas têm medo e raiva; as manchetes são as mesmas, as mesmas as injustiças. Foi Ricardo Oiticica, tantos amarildos, a professora aposentada. Foi minha amiga, meu amigo, meu colega de faculdade e algo está diferente e talvez não se creia tanto assim. Tudo é o mesmo desalento, mas de mãos dadas.
Entre a indiferença, a luta, a esperança e a descrença nascem as crianças da minha casa. E quem vai educar esse sorriso, além de mim? Quem te erguerá e te levará ao mar, até onde dá pé? Depois de mim?

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

O renascimento de Vênus

Tal como cai um rei de copas, caiu o sol de primavera.
A neblina levanta às quatro da manhã.
Assim não se vê o sol diretamente, mas ele está ali,
tingindo de cinza as folhas verdes
daquele canto de mata.
Enquanto isso, uma cascata cicia
um cântico
alvoroçado e brando, mas não sussurra.

É Oxum que grita, palidamente, a cabeça nas pedras,
o ombro ainda não saiu das águas.

Alguns raios a mais, amarelos, e enfim
ela emerge tensa, enregelada,
os lábios roxos,
ainda tem olheiras.
Na pele transparente dos seios pulsam
geográficas veias
azuis e verdes,
mas na cabeleira grisalha já se veem
uns fios ruivos,
querendo fazer aurora.


É preciso amar Oxum, mimá-la,
raspar com facão suas escamas de peixe,
deixar sangrar somente o necessário
e então
preparar-lhe um verão
(ameno),
deixar que tome
a alma das árvores,
amar iara virando fada
.
.
mais uma vez.



Ana Claudia Abrantes

sábado, 12 de outubro de 2013

o garoto do cinema

de que adianta
estar bonita
pra você
se não me liga
e não me queima
nem me vê
feito o que eu era
quando era
só você
o garoto
do cinema.





Ana Claudia Abrantes

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Compatibilidade

Porque me conquista com um sorriso que derrubará as vagabundas e/ou os vagabundos
em quem porventura seu olhar se demorar
(isto é, que se atravessarem entre nós).
Porque me exige com pulmões maduros e o talento dispersivo de tornados.
Eu sou de peixes, ele é de áries.



para Adriano



Ana Claudia Abrantes