sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Espelho escrito

Enquanto escrevo, espelho, e um espelho vai se desenhando à minha frente. Primeiro e sempre os olhos, com o seu desfoco úmido, sua quase interrogação de sobrancelhas. Alinham-se meias-verdades na curva dos cílios, e o tempo acumulado no canto dos sorrisos. Depois um nariz abafado, arfando por alívios vasoconstritores e odores frescos, no desespero de respirar de vida, ou de vício. Na superfície do papel, ora laminado, pouco a pouco vão ponteando os poros, cada dia mais abertos e alertas a toda oxigenação. Que aerada venha a vida contra a pele! Agora, no vidro, os lábios pálidos e finos palavream indelicadezas para se ouvir do espelho vivo, e a moldura cresce junto aos cabelos, enferrujados. Escrito isto, pronto o espelho está e o espelho é tudo, mas o que mostra é nada. Ao contrário embaça, se, de perto, o ar que se respira é quente e a superfície, fria ... ou refratária.
26/02/2009
Ana Claudia Abrantes

Nenhum comentário: