terça-feira, 21 de abril de 2009

Vesuv&ana

Para derreter pedra é preciso muito mais que fogo. É preciso mais que insistência. É preciso ser mais que contínuo ou intermitente. Para derreter pedra é preciso que a terra sue, que a terra babe
a intolerância contra seu próprio casulo, e se abra em leite. Vermelho e quente.
Derreter pedra não é coisa que se faça à toa, ou impunemente. Também não é coisa que se faça de imediato.
Para derreter pedra
antes
é preciso entender a dívida que se contrai com sua outrora perenidade,
é preciso aceitar a dívida por tê-la feito tirar os pés da terra firme,
é preciso acatar a dívida por desafiar o sólido, o solo e o sol. Porque do sólido é feito pasta ardente, o solo se afunda em pista ácida, e muda-se o sol do céu pra colocar no chão.

E a dívida com a pedra nunca se paga.
Afinal, era ela quem segurava os papéis contra o vento, era ela quem enfeitava a subida dos morros do Rio, era ela quem mantinha o protocolo de mármore.
A pedra não é essencialmente carinhosa; o corpo é que se amolda a ela para deitar ao sol. Mas, numa pedra, firmam-se os pés pra sustentar todas as certezas dos contos de fada, toda a arrogância ingênua das certezas rígidas, todas as certezas de fato e direito. Todas essas certezas, porém tão confortáveis...

Promessa de pedra não se quebra, derrete-se. Então é preciso derretê-la com muita força, medo, amor e hábito. É preciso derretê-la.
Mas a pedra cobrará seu crédito,
la-te-jan-do
todos os dias, pela manhã e à noite,
verdades ferventes, lembranças de sólida instabilidade e um amor de granito - o fogo eterno...

Pedra,
não ver o Vesúvio não significa não amá-lo _ cláusula pétrea _ para sempre.


Ana Claudia Abrantes
abril de 2009

(Para V.)

Nenhum comentário: