terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

ao abrigo da luz

ao abrigo da luz, os perfumes caros
e os remédios.
contra os flashes, a proibição de máquinas e celulares.
ao abrigo, na penumbra devem estar as obras raras,
embora no escuro bibliotecas sejam pó.

lentamente as pessoas derretem
e se fossem de cera escorreriam
sob holofotes.

o tempo e a luz, uma lei da física
inevitável teus olhos cada vez mais distantes.

é a luz que ameniza humores melancólicos,
que deixa contritos os prováveis suicidas, e eles retrocedem.
a luz que as mãos dão aos filhos e que faz
crescerem as plantas,
a luz que evapora na praia,
que enternece uma manhã de sol, mas a luz do sol
derrete, e tudo é ícaro, todo voo cai.
dói ao continuar batendo no mesmo lugar,
diariamente.

também a pele das testemunhas fica
feito frinchas de falésias, amorenada.
o tempo e a pele, muros
de barro ou bronze, quebrados.
manchas, sardas, linhas, pequenas mágoas, todo dia.
as fotografias craquelam, memórias falhas.
mas se até as testemunhas envelhecem,
a solidão não é um privilégio.
nenhum abrigo.



Ana Claudia Abrantes

9 comentários:

Unknown disse...

A solidão por vezes é esse abrigo, e um grande privilégio. Um abraço.

Ana Claudia disse...

A solidão não é privilégio de poucos. A solidão não é abrigo contra a luz nem contra a passagem do tempo. Às vezes ela é um presente.
Um beijo

Anônimo disse...

"(...) tudo é ícaro, todo voo cai.
dói ao continuar batendo no mesmo lugar,
diariamente."

Excelente poema, adorei!

Beijo.

Lê Fernands disse...

adorei a definição de solidão... também não é companhia.


bjs meus, linda.

Yan Venturin disse...

"a luz que as mãos dão aos filhos e que faz
crescerem as plantas,
a luz que evapora na praia,
que enternece uma manhã de sol, mas a luz do sol
derrete, e tudo é ícaro, todo voo cai.
dói ao continuar batendo no mesmo lugar,
diariamente."


Lindo e catártico, como sempre.

Yan Venturin disse...

Achei um pouco da minah solidão nacompanhia de seus versos. Obrigado. Beijos.

Flá Perez (BláBlá) disse...

gostei disso, filoso-poetando dentro copm o que se vê fora virou um texto mto bom!

Thiago Crespo disse...

Hermético e suave, gostoso de ler e de sentir.

Muito bom, prazer estar aqui! E obrigado pela leitura tbm.

Bjs

Tuca Zamagna disse...

Sou muito curioso, bisbilhoteiro mesmo. Mas você me supera, Ana. Foi investigar o tom da pele das frinchas de falésias!

(Avisei que ia espalhar abobrinhas, né?)